sábado, janeiro 10, 2004

Pantheon esquecido (2)

(Perdoem-me, mas hoje vou alongar-me porque a causa é nobre!)
A causa-nossa (minha também pois é de Portugal que se trata, embora nem sempre pelas mesmas razões) publicou há uns dias a resposta à análise que fiz a um post do Vital Moreira. Vital, que desde já parabenteio pela entrada na blogoesfera e pelo ritmo feérico de edição (superior ao meu, espante-se!), leu mal nas entrelinhas e acusa-me de crítico sem saudade de Coimbra.

Por entrada do Lobo-do-Mar, hoje ancorado no Porto, abordei en passant a problemática de Coimbra. Facto assaz distinto na génese da maledicência proclamada, pois o que me move é assertivo e nobre, não fosse eu um emigrante enamorado pela Lusa Atenas. É certo que critiquei o Vital Moreira pela abordagem inicial, tão-somente por saber que, sendo embora de fino trato e rara inteligência, teve o poder e não teve a ousadia.

Comecemos pelo início. Ser cientista é obrigação de quem o Estado investiu de saber na esperança de que a semente se propague. Assim, o Coimbra Group, embora louvável, deve ser entendido como uma parceria natural na lógica da tradição Coimbrã. Não falo da normal actividade da Universidade, o problema coloca-se a montante.

Há vinte anos Coimbra dispunha de uma vantagem competitiva face ao resto do País. Tinha em relação ao ensino aquilo que na gestão se designa por elevada Brand Equity. Bastava a invocação do nome e ficava no ar a deferência que se deve ao Saber. Era esta a força da sua Marca. Ser a terceira cidade era algo que já se percebia estar a fugir, não havia a tradição de uma indústria alicerçada em gentios temerários. Aveiro afirmou-se assim. Em suma, Coimbra podia e devia ter-se diferenciado como arauto de ensino. A concorrência é hoje fortíssima; Lisboa, Porto, Aveiro e Braga são já referências incontornáveis na oferta de educação. Por falta de tradição de empreendimento, Coimbra não se alicerçou no ensino privado que se sabe ser hoje, quer se goste ou não, o bastião da melhor oferta nos países que perceberam que o conhecimento também se pode exportar. Esta é a excelência que potencia a criação de serviços de alto valor acrescentado, alicerçados no conhecimento e dificilmente replicáveis. Para isso, distanciem-se da cátedra e com humildade e em consciência façam a vossa contrição. Só espíritos livres podem fazer esta revolução. Tirem as devidas ilações e aumentem a oferta de conhecimento, permitam a saudável lógica de mercado no ensino (o contrário é demagogia), deixem os alunos escolher (já o fazem noutras cidades ...), façam de Coimbra a Boston portuguesa. Isto ainda é possível pela dimensão, localização, docentes e tradição da cidade. Repensem a oferta em função da procura, melhorem a qualidade do serviço para que os alunos não falhem, criem rankings para perceber o sucesso dos profissionais que criaram. Não envelheçam, os pais agradecem!

Falemos agora de outros Serviços.

Sabendo-se que Coimbra ganhou diferencial na Saúde nos últimos anos, resultado de uma estratégia cimentada num Hospital Universitário moderno e com quadros de inegável valor, deve fazer-se aposta forte neste cluster antes que se repita aqui o que já aconteceu no ensino. Daqui a 20 anos ninguém fará 200km de Lisboa, ou 90 km do Porto, para se tratar em Coimbra se não percepcionar vantagem clara no serviço prestado. Criem mais sinergias entre os fornecedores de saúde, melhorem a produtividade dos serviços, apostem em cuidados de saúde que exijam elevada especialização, criem unidades com serviços de hotelaria excepcionais, preparem oferta para a prevenção (haverá médicos bastantes?), formem mais médicos e enfermeiros, façam de Coimbra a cidade verde da Saúde.

Falta falar do Direito que tanto garbo tem dado a Coimbra. Faculdade da teoria faz os conceitos que os outros adoptam. Será suficiente? Penso que não! Freitas do Amaral, Jorge Miranda, Marcelo Rebelo de Sousa e tantos outros não se formaram em Coimbra. Uma hora de televisão projecta mais uma cidade do que um ano de aulas, aprendam com a Figueira-da-Foz. Se olharmos para os grandes escritórios de advocacia então aí a diferença é gritante; o pragmatismo das escolas de Lisboa leva de vencida a tribuna de Coimbra. Saberá o VM falar sobre este tema melhor do que eu, mas se o fizer, faça-o sem bairrismo e mostre-nos o caminho.

Falemos ainda na descentralização (não falei em regionalização ...); façam lobby para sediar em Coimbra alguns Institutos e Direcções do Estado. Faço votos para que a iniciativa da API não seja uma mera formalidade para cumprir calendário. Interessa também ao País reduzir assimetrias; apostem nesta estratégia!

Dito isto Moreira, se és Vital (e Coimbra precisa de valores assim) eu fui Exacto!



Educação; palavra hoje demasiado forte pois a maioria dos agentes demitiu-se da nobre obrigação de educar ... quantos são os educadores que conhecem as ansiedades, expectativas, dificuldades e capacidades dos seus educandos? Esta é outra história, fica para segundas núpcias.
Da primeira e da segunda educação já falei também, e essas, quer queiramos quer não, são as mais importantes.
É nestas idades que se apreendem os valores e se forma o carácter, e uma nação sã faz toda a diferença.

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