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Quinta-feira, Fevereiro 26, 2004

Compromisso Portugal (2)

Sofisma:
Alguns iluminados têm invocado a Noruega como paradigma da sociedade exemplar. Nada mais falso!

Axioma:
Sou, por natureza, um acérrimo defensor do modelo Sueco. Penso que é, embora imperfeito, a melhor combinação entre a preocupação social e a recompensa económica. Aqui, estas dimensões andam de mãos dadas sem despesismos megalómanos ou contenções estéreis. Contudo, mesmo neste caso, entendo a comparação escusada. Portugal tem idiossincrasias próprias que requerem tratamento à medida; não se muscula um atleta para correr da mesma forma que se prepara outro para nadar.

Observação:
A fronteira viking, com perto de 2.000 km, não separa só território. O capitalismo mais dinâmico da Suécia não descurou a protecção social, e tudo isso teve um preço nos impostos. Assim, não há muito tempo, os noruegueses acolhiam de bom grado os impostos que alguns suecos escondiam do pesado sistema tributário. Contudo, a solidariedade aparente com os suecos era meramente mercantil.
A história recente revelou riquezas que dificilmente os noruegueses poderiam adivinhar. Uma das mais activas pisciculturas do planeta, a única jazida de petróleo da Europa e o melhor filão de alumínio do mundo alteraram a postura deste povo. Nada como um bom pretexto para não integrarem a Comunidade Europeia. A partilha da herança é esforço demasiado para corações arrefecidos pelo árctico.

Experimentação:
Há alguns anos atrás viram-se algumas plataformas petrolíferas a pesquisar petróleo na costa portuguesa. O ouro negro, no entanto, se o há, está bem guardado.
Não temos alumínio mas somos ricos noutros minérios. Contudo, nenhum deles tem a relevância de uma grande superfície.
Temos a maior reserva piscícola da UE(Continente-Madeira-Açores) que, como se sabe, vai ser bem explorada pelos espanhóis.
Sobra-nos a UE que nos oferece, naturalmente, solidariedades e obrigações. Dez anos bastaram para se perceber que a subsidiariedade reverte mais a favor dos interesses dos mecenas. Em economia de mercado não há almoços grátis. O balanço, apesar de tudo, foi muito positivo.

Conclusão:
Noruegueses e kuwaitianos têm mais em comum do que se pensa. Não havendo heranças, resta-nos sonhar com um milagre ou, ao invés, sorrir, arregaçar as mangas, e reinventar Portugal.

0-5

Cinco dias fora e a Académica brinda-me com uma abada!
Temo agora que as minhas férias da Páscoa se possam converter em algo apocalíptico.
VIVA A BRIOSA!


A minha 2ª equipa também não esteve mal; vou ter uma semana em cheio em ... Lisboa.

Sábado, Fevereiro 21, 2004

Telegrama

Cinco dias fora; see you!

CAELUM

Faz hoje 42 anos que John Glen orbitou a Terra. A aventura durou 5 horas. Haveria de repetir a experiência aos 77 anos. A cápsula dera lugar ao mais confortável Space Shuttle Discovery.
A evolução continua hoje de forma implacável. Glen e o Shuttle não voltarão a voar.

As estórias da nossa História.

O que eu dava por um segundo de imponderabilidade ...

Sexta-feira, Fevereiro 20, 2004

Controvérsia (2)

O Celso Martins do Barnabé brindou-me com “João Mãos de Tesoura, acho que misturas coisas diferentes, eu sou contra as quotas, mas não deixo por isso de ver a sociedade aberta como uma comunidade de diferenças”. Veio a crítica a propósito de um comentário que deixei no seu post; sugeria-lhe, naturalmente, a leitura do meu.

Para aloirar a mensagem, larguei novo comentário.

"Celso, eu não falei em quotas; falava sim de fundamentalismo. Não confundas a prova com o método. Também eu defendo o direito à diversidade; não suporto, contudo, a ditadura da diferença! As crianças não são mercadoria que se obtenha para significar a vida ou por capricho da igualdade. Não abrigo a negação sistemática nem a afirmação cega. Cada caso é um caso!"

Não temo a crucificação pois pior, insuportável, seria ressuscitar de seguida!


Dei uns retoques no meu comentário porque o original tem desacertos próprios de quem escreve por impulso.

Controvérsia

À volta de uma entrevista de Luís Villas-Boas levantou-se um debate inflamado. Embora corra o risco de não ser percebido vou tentar expor a minha posição.

Sou frontalmente contra fundamentalismos. Estes, infelizmente, provêm geralmente das minorias que encontram neste modelo uma forma de pressão, quando não de controlo, de quem tem opinião diferente. Encontramos um bom exemplo na comunidade negra dos EUA. Após terem obtido a alienável igualdade de direitos, nada mais justo, querem agora impor a diferença. Quotas nos empregos, preterindo-se assim muitas vezes outros melhores, e cedência na opinião, ignorando-se o papel da história na formação da Nação. A estátua adiada de D. Catarina de Bragança em Queens, bairro que lhe honra a condição, é um bom exemplo do branqueamento da diferença.

Espero que o BE, Ilga e outros defensores dos direitos dos homossexuais não caiam na tentação de se arrogarem como protectores da verdade; neste caso, penso que não têm razão. Que o direito à diferença não se faça à custa de menores!

Antes de mais temos a questão do referencial. O problema não se põe na perspectiva de quem adopta mas sim na dimensão do adoptado. Interessa, portanto, defender primeiro os interesses da criança. Havendo alternativas, que não as frias Instituições do Estado, devem entregar-se as crianças aos casais com maiores probabilidades de sucesso.


Uma criança precisa de amor, mas só isso não lhe garante a felicidade.

Quinta-feira, Fevereiro 19, 2004

Instantâneos

A Justiça está a atingir um elevado nível de sofisticação. Os magistrados e os juristas competem num mercado arbitrado pelo sucesso mediático, e as carreiras sobrepõem-se aos mesquinhos interesses dos arguidos, testemunhas e seus próximos.

Hoje, já não basta a instrução prévia, a argumentação de defensores e acusadores, ou o bom-senso dos magistrados. Quem tiver mais informação poderá produzir mais conhecimento. Assim, as fugas de informação não são mais do que Competitive Intelligence. Contudo, se a negociação vai longa, este método perde valor. É fundamental novo expediente, e quem tem poder pode chegar a instrumentos só imagináveis na literatura medieval. O libertar para desde logo apresar é uma forma de tortura com paralelo na roda; alivia-se primeiro para que novo garrote ganhe sentido. Aguardemos a resposta dos juristas; antevejo a guilhotina!

Kitsch

Tell It Like It Is

If you want something to play with
Go and find yourself a toy
Baby my time is too expensive
And I'm not a little boy

If you are serious
Don't play with my heart
It makes me furious
But if you want me to love you
Then a baby I will, girl you know that I will

Tell it like it is
Don't be ashamed to let your conscience be your guide
But I know deep down inside me
I believe you love me, forget your foolish pride

Life is too short to have sorrow
You may be here today and gone tomorrow
You might as well get what you want
So go on and live, baby go on and live

Tell it like it is
I'm nothing to play with
Go and find yourself a toy
But I... Tell it like it is
My time is too expensive and I'm not your little boy

Aaron Neville


Já ninguém dança Slow. Agora as danças são one-to-one! Slam dancing?

Terça-feira, Fevereiro 17, 2004

Preventivas & Precárias

O toque fez-se sentir estridente na nova instalação de som. O ruído ecoou nas paredes num arranhar profundo e desconcertante. Mário, 32 anos, pai, está há 13 meses sem liberdade maior do que aquela que a planta e rotina da sua ala permite. A denúncia de um amigo do filho mantinha-o em preventiva. Quem o conhecia sabia bem que as madeixas brancas não provinham de desgosto maior do que aquele, o de olhar o filho sem falar porque a voz não obedecia ao que a consciência não alcançava.

José, 27 anos, teve por furto repetido uma sentença de 24 meses. Não tivesse uma arma de fogo e só teria conhecido os calabouços da judiciária. O ofício que agarrava na mão não mentia, o bom comportamento e a lei permitiam-lhe agora o benefício da precária. Olhou-se no pequeno espelho; há 11 meses que não usava gravata e estranhava vê-la assim dependurada. Acendeu um cigarro e numa inspiração prolongada deixou o quente invadir-lhe os pulmões. Era hoje um homem livre; contudo, não sorria.

A campainha sibilou novamente, agora de forma mais nítida. A hora era de encontros e o filho de Mário nunca falhara uma visita. Vinha com a avó porque a mãe não vencera ainda a vergonha. Se Mário sofria, ela definhava.

Há meio ano que José e Mário partilhavam a cela. Abraçaram-se, a cumplicidade na fatalidade cria laços que nunca se apagam. Se o primeiro errara, o segundo sofria a injustiça do destino. Os olhares cruzaram-se e no fundo dos negros olhos de Mário vislumbrou-se um brilho. José nunca saberá se ele sorria ou chorava.

Muralhas de almas.

Teresa Dias Coelho, 1994.

Segunda-feira, Fevereiro 16, 2004

Compromisso Portugal

Entendo que iniciativas destas, venham de onde vierem, só podem ajudar o País. "Pretende-se aprofundar a discussão dum novo modelo económico para Portugal, suas reformas e respectiva concretização". Que se pense o futuro sem o peso do passado nem a indiferença do presente. Que o sonho seja grande que os homens, esses, serão o reflexo da odisseia. Haja estratégia!

Este tema não se esgota num só post, num só blog nem numa só convenção. Contudo, não me vou esquivar à obrigação cívica de pensar, bem ou mal, o futuro deste quintal.

Como já referi, o mérito da convenção é inegável.
Primeiro, por ser autofágica. A maioria dos empresários e gestores presentes pertencem à nomenclatura responsável pelo que somos hoje; foi entre eles que emergiram grupos económicos, associações industriais e sindicatos, e não há partido político que não lhes deva favor. O anúncio da convenção foi assim o reconhecimento da culpa avant la lettre; louvável, estranhamente louvável para um povo latino.
Segundo, por o País precisar de sair da apatia em que caiu. Os partidos políticos esgotaram as mensagens e estão descredibilizados, e só vozes com sucesso terão autoridade para serem ouvidas.
Terceiro, por pertencermos a uma Europa que cresce e que não se compadece com assimetrias. A teoria dos vasos comunicantes impera em mercados abertos; abrem-se fronteiras e redistribui-se a oferta, haja procura!
Quarto, por se encontrarem neste núcleo restrito algumas das melhores cabeças do País. Preparação científica sólida, trajectos profissionais imaculados e independência financeira para garantir que o pensamento vem despido de compromissos.
Quinto, por vivermos tempos de mudança e incerteza, e por sabermos, entre as poucas verdades que nos restam, que somos uma Nação. E isso, numa Europa em formação, dá-nos toda a força!

No entanto, nem tudo são rosas.
Primeiro, o site do evento tem a extensão “.com” capitulando à lógica “commerce”. Deformação de alguns gestores preocupados com a globalização; foi pena terem-se esquecido da tradução do site para inglês e castelhano ...
Segundo, os patrocinadores do evento são na maioria de capital externo. Vodafone, Totta, Linklaters, Heidrick & Stuggles, Somage, Roland Berger, Deloitte, ATKearney e Accenture não têm os centros de decisão e o capital em Portugal.
Terceiro, alguns dos empresários e gestores presentes no evento tiveram responsabilidade directa na transferência de património nacional para o exterior; Carrapatoso na Vodofone, Vaz Guedes na Somague, Horta Osório no Totta, etc.
Quarto, as propostas apresentadas são na maioria generalidades. Das apresentações que as enquadram sobressai a do Carrapatoso pois tenta apresentar uma visão macro global. Para quatro eixos - cidadão, estado, empresas, e enquadramento - encontramos diagnóstico e prescrição. Uma análise estratégica muito na senda de trabalhos da Mckinsey, parece-me! António Borges deu uma lição e, como seria de esperar, ficou-se pela teoria. As outras apresentações não acrescentam muito mas valem a visita, algumas pelo saber e outras pelo espanto.

O que faltou?
Se analisarmos com algum detalhe as propostas a debate e as apresentações efectuadas, percebemos que a Visão que os empresários e gestores têm para Portugal se resume ao quadro das preocupações das suas empresas; i.e. um Estado mais eficiente e eficaz. A temática andou sempre à volta das operações e muito pouco no campo da estratégia (Jorge Armindo andou lá perto, ficou-se nos conceitos). Contudo, a Nação não se esgota no Estado e muito menos na produção. Para se discutir um novo modelo económico para o País, digo eu que não sou economista, faltaram as perguntas de um milhão de dólares. Numa Europa em crescimento qual deve ser o nosso papel? E daqui a 10/20 anos? Onde nos diferenciamos? Em que sectores devemos apostar? Quais os objectivos e targets a atingir? Quais os factores críticos de sucesso para esse desiderato? Etc. (e.g. sabendo-se que a maioria do transporte internacional é feito por navios mercantes, e que o principal eixo que une a Europa aos mercados Americano e Asiático passa em mares nacionais, terá Portugal a oportunidade de se transformar num hub?).
Deixo como mostra de inconsistência uma proposta recorrente nas apresentações; melhorar a Educação! Contudo, para quê investir no ensino se não soubermos em que especializações devemos apostar?
É esta falta de agulha, a que muitos chamam estratégia, que faz falta. Aguardemos por mais Visão na 2ª convenção.

E agora?
Precisamos desta e de outras iniciativas. É fundamental questionar o futuro. Nenhum sector da sociedade civil se pode demitir deste propósito. E que não nos assomem vontades prossecutórias nem nos refugiemos em guetos intelectuais pois todas as iniciativas são válidas, cumpre-se assim a democracia.



Só conheço o astrolábio ...

Escapadela

A necessidade que tive de me afastar não resultou de férias paradisíacas como erradamente se poderia depreender de um dos comentários ao post anterior. Teria sido melhor, convenhamos, do que a urgência de tempo para trivialidades, trabalho e outras coisas menores. Sinto hoje novo afogo. Sim, porque agora que garanto visitas sem conteúdo percebo que criei expectativa e isso, meus amigos, é um elo que não se pode quebrar. Agradeço, assim, a todos os que aqui vieram para alento meu e dos textos que aqui polvilhei.

Quinta-feira, Fevereiro 12, 2004

Pasmo

Domingo, Fevereiro 08, 2004

Silêncio

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P.S. Este post chegou a ter 100 linhas em branco ...

Sábado, Fevereiro 07, 2004

Compra por impulso

A FNAC não deixa de me surpreender. Queria comprar um livro mas acabei por sair com um CD.
Os Ghost in the machine foram hoje apresentar a sua obra #2 (humanize). O som que emanava da cafetaria era insinuante. Dei por mim a procurar o CD, e por 3,5 € tive direito a 11 temas. Paguei uma esmola e deram-me um tesouro. Há dias assim.

Fica a imagem de outros para temperar a ideia.

O grupo é meio clandestino. Um bom empresário e um gestor de imagem fariam toda a diferença.

Burrocracia

Sonâmbula, entra pelas nove a dormir
na esperança de um dia sem demais;
na secretária um despacho para sentir
a mudança sem aviso nem preparo.
Correr os olhos pela norma, sorrir
com a falta de surpresa; os sais
e ficas, os cortes no que falta e no caro,
as apresentações que não terminam,
a cadeia de cumprimentos a cumprir.
Sobra-lhe o que os antigos ensinam;
basta manter o atraso, basta anuir
sem pensar e não haverá reparo.
RAP
(Reforma da Administração Pública)


Danny Benson

Ecos do silêncio

Uma das bondades dos blogs reside na possibilidade de se transformar um texto de autor num debate de ideias. O sistema de comentários não surge aqui como uma vaidade, mas tão-somente para possibilitar que os textos sejam enriquecidos com as reflexões de outros. Há quem prefira pensar sozinho; eu não, até porque não tenho todas as respostas. Pelo que tenho lido sei que há trocos que não se podem desperdiçar!


Jim Clark: Quando não ando a 200 tenho tempo para pensar!

Quarta-feira, Fevereiro 04, 2004

Subsídio de férias

Anda um homem a esforçar-se, a ficcionar o que não entende e ninguém comenta?!
Vou fazer pausa até à vossa reacção. Estou preparado para hibernar!



Será que o post "Diálogos Impossíveis" não permite diálogo?

Cinema Paradiso

Descobri acidentalmente esta webcam do Pearl Beach Resort; Bora-Bora, claro!
Acreditem-me, o paraíso fica ali! Como compreendo a revolta do Bounty; vários meses no mar e dão de caras com este jardim de ninfas ...

OOPS!

Janet Jackson, entusiasmada com a audiência de 100 milhões de adeptos do Super Bowl, numa atitude espontânea e maternal, mostrou ao mundo o que só os seus filhos deveriam ver. Afinal a América ainda anda de cueiros.

Não fiz mais do que o YSL!

O site da MTV brindou-nos, no passado dia 28, com este delicioso apontamento sobre o anunciado momento chocante: “At the time of this report, MTV thought that the 'shock' was going to be the as-yet-unannounced appearance of Justin Timberlake as part of Janet's performance.”

Terça-feira, Fevereiro 03, 2004

A conta por favor!

Analisar sem informação é especular! Apresento aqui a despesa segundo o Orçamento do Estado para 2004, publicado em Outubro de 2003 pelo Ministério das Finanças. É bom recordar! Amanhã virá o comentário possível de um iletrado esforçado.

Varinas e peixe fresco

Todos sabemos a força que o futebol tem nas sociedades ocidentais. A nossa não é excepção. Mobiliza, cria paixões e serve de catarse para a lufa-lufa do dia-a-dia.

Ver um treinador a criticar um jogador adversário, a pedir para abandonar o futebol nacional, é, a meu ver, mero folclore. Mourinho podia ter encontrado melhor forma para se exaltar, mas o que disse foi rigoroso: um jogador simulou falta e fez anti-jogo, e o treinador do Porto tem sido persona não grata dos meios de comunicação. O sucesso e arrogância são mistura mais do que explosiva e fazem manchete.

Pior, muito pior, é ver um executivo apelar à emoção, num tom lamecha e maldicente. Parece evidente que mentia e só por isso vai responder em tribunal. José Eduardo Bettencourt escudou-se no prestígio de um grande clube e os Media exploraram a situação como momento da verdade. Fica a confirmação da macrocefalia de um país antiquado.


Porto e Sporting merecem melhor. Fica-me a Académica e o sol de Lisboa como consolação.

Olhar lúcido

O editorial do Nicolau Santos, no suplemento Economia do semanário Expresso, é simplesmente imperdível. Simples e objectivo, coloca o dedo na ferida; o Estado não é um fim em si mas tão só um meio, e os empresários e a sociedade civil têm a obrigação de inovar em áreas que não são de “missão” (no sentido messiânico do termo); i.e. no associativismo, na formação e na I&D. Muito mais haveria a dizer, mas só isto bastou para me fazer anuir.

Acrescenta ainda um apontamento sobre a Justiça em que remata “Onde outros pecaram, Cardona foi virtuosa”. Fiquei com a sensação que lera o meu post ...

É com lucidez e sem pacóvios servilismos editoriais, à esquerda ou à direita, que se faz informação. Nicolau pensa pela cabeça dele e isso, nos dias que correm, é feito raro.

Diálogos Impossíveis

A cidade de Qalqiliya na Cisjordânia encontra-se isolada do exterior por um muro de 8 metros de altura. Rivaliza em dimensão com a muralha da China e em intenção com o muro de Berlim. O único ponto de passagem é tão estreito que os carros da cidade jamais poderão sair. Os burros, outrora em extinção, servem agora como meio de transporte. Mais do que povos o muro separa crenças, e não há nada como a fé para acirrar ódios. Não se questionam as verdades da alma nem as formas de as impor. Há muito que a lógica não tem aqui assento.

Ali Jaafar nasceu em Nablus há 22 primaveras. Nunca soube o que seria um dia em descanso, sem mais aborrecimentos do que as trivialidades da vida. Há mais de seis meses que não trabalha. Maldita hora, aquela em que optou por ser camionista, pensou.

Aki Kaurismäki tem ascendência polaca. Os seus avós viveram em Varsóvia; bastava-lhe a memória de uma diáspora forçada para não acreditar na força da tolerância. Há três meses abandonara o doutoramento em San Diego para cumprir com o dever de proteger a Terra Santa. Calhou-lhe em escala estar hoje no check-point.

Via-se agora distintamente na linha do horizonte a silhueta do par, à frente Ali puxava o burro carregado com duas caixas com rações de arroz, azeite e açúcar. Não fosse o apoio da Cruz Vermelha e há muito que estariam sem mantimentos.

- “O que levas ali?” pergunta Aki apontando para as caixas.
Ali olha-o espantado “Como sabe o meu nome?”
- “Responda só ao que lhe pergunto! O que tem nas caixas?”, o tom adivinhava problemas.
- “Aqui só tenho rações” afirma Ali colocando a mão na caixa.
Num gesto brusco Aki encosta a arma ao palestino. “Agora pergunto eu ... de onde me conheces?”
- “Quem, eu? Mas foi você que me tratou pelo nome ainda agora aqui!” desespera Ali.
- “Tornas a trata-me pelo nome e morres, enterro-te a ti e ao teu burro ali na valeta, porco imundo!”
- “Imundo terá sido teu pai que cobriu a tua mãe ó cão infiel! Hás-de morrer aqui!”.
Aki e Ali envolvem-se numa luta corpo a corpo. A preparação do militar leva a melhor. Ali encontra-se agora prostrado sob o pé ameaçador de Aki.
- “Pergunto-te pela última vez, o que tens nas caixas?” indaga Aki enquanto agarra a corda que pende do burro.
- “Passamos fome, o que querias que fosse? A justiça?” cospe Ali com algum pó que engolira.
- “Veremos se falas verdade!” e num gesto brusco puxa a corda do burro.
A explosão ouviu-se do outro lado da cidade. Um ancião do Hammas que dormitava na sombra de um coberto abre os olhos e, sem perder a calma, proferiu “Está-se melhor aqui do que ali!”.

Segunda-feira, Fevereiro 02, 2004

Bush presupuesto

Não passou de um susto. O semanário Expresso publica esta semana na revista suplemento Única o artigo “De volta às raízes”. Pergunta-se em caixa, e passo a citar, “Sabia que George W. Bush é descendente de portugueses?”. Leitura mais atenta vem explicar que o presidente americano tem ascendente na D. Urraca que, segundo a jornalista, era “mãe do fundador de Portugal ...". Nada de mais falso; D. Urraca tinha por meia-irmã D. Teresa, essa sim mãe de Afonso Henriques e filha bastarda de Afonso VI, rei de Castela e Leão.

Foi Afonso VII, filho de D. Urraca, coroado imperador de “Toda a Espanha”. E foi contra este primo que Afonso Henriques combateu no Minho e com o qual fez o pacto de “fidelidade, segurança e auxílio contra os inimigos”. Expulsaram-se assim os mouros da Península e desenharam-se os contornos de Portugal.

Para quem aprendeu as origens na escola, algo que falhou à jornalista Catarina Carvalho, será claro entender que Bush tem ascendente espanhol para descanso do nosso passado. Poderia, contudo, ter ascendente na dinastia Filipina que isso não nos faria mossa.

Temo agora o pior, vir a descobrir-se que Fidel de Castro, Bin Laden, Kim Jong II e tantos outros possam ter ascendentes portugueses. O Expresso lá sabe!


Houve várias Urracas; duas filhas de Afonso Henriques, uma legítima e a outra bastarda, a mulher de Afonso II, e outras que ficaram no tempo pois este nome já hoje se perdeu.

Embora republicano, presto aqui vassalagem à primeira bandeira.

Palpitações

Já o disse, somos o país da emoção. À fragilidade da nação basta um pretexto para solidariedades espontâneas, desabridas e fotogénicas. Ganham as televisões, a publicidade e os políticos com este torpor que se exalta a pedido.

Está o presente emparedado por este povo debilitado pela história e por um regime sem a cura. Fica o futuro dependente da audácia das futuras gerações, e que estas façam mais e melhor. O tempo devia correr mais depressa!