segunda-feira, fevereiro 16, 2004

Compromisso Portugal

Entendo que iniciativas destas, venham de onde vierem, só podem ajudar o País. "Pretende-se aprofundar a discussão dum novo modelo económico para Portugal, suas reformas e respectiva concretização". Que se pense o futuro sem o peso do passado nem a indiferença do presente. Que o sonho seja grande que os homens, esses, serão o reflexo da odisseia. Haja estratégia!

Este tema não se esgota num só post, num só blog nem numa só convenção. Contudo, não me vou esquivar à obrigação cívica de pensar, bem ou mal, o futuro deste quintal.

Como já referi, o mérito da convenção é inegável.
Primeiro, por ser autofágica. A maioria dos empresários e gestores presentes pertencem à nomenclatura responsável pelo que somos hoje; foi entre eles que emergiram grupos económicos, associações industriais e sindicatos, e não há partido político que não lhes deva favor. O anúncio da convenção foi assim o reconhecimento da culpa avant la lettre; louvável, estranhamente louvável para um povo latino.
Segundo, por o País precisar de sair da apatia em que caiu. Os partidos políticos esgotaram as mensagens e estão descredibilizados, e só vozes com sucesso terão autoridade para serem ouvidas.
Terceiro, por pertencermos a uma Europa que cresce e que não se compadece com assimetrias. A teoria dos vasos comunicantes impera em mercados abertos; abrem-se fronteiras e redistribui-se a oferta, haja procura!
Quarto, por se encontrarem neste núcleo restrito algumas das melhores cabeças do País. Preparação científica sólida, trajectos profissionais imaculados e independência financeira para garantir que o pensamento vem despido de compromissos.
Quinto, por vivermos tempos de mudança e incerteza, e por sabermos, entre as poucas verdades que nos restam, que somos uma Nação. E isso, numa Europa em formação, dá-nos toda a força!

No entanto, nem tudo são rosas.
Primeiro, o site do evento tem a extensão “.com” capitulando à lógica “commerce”. Deformação de alguns gestores preocupados com a globalização; foi pena terem-se esquecido da tradução do site para inglês e castelhano ...
Segundo, os patrocinadores do evento são na maioria de capital externo. Vodafone, Totta, Linklaters, Heidrick & Stuggles, Somage, Roland Berger, Deloitte, ATKearney e Accenture não têm os centros de decisão e o capital em Portugal.
Terceiro, alguns dos empresários e gestores presentes no evento tiveram responsabilidade directa na transferência de património nacional para o exterior; Carrapatoso na Vodofone, Vaz Guedes na Somague, Horta Osório no Totta, etc.
Quarto, as propostas apresentadas são na maioria generalidades. Das apresentações que as enquadram sobressai a do Carrapatoso pois tenta apresentar uma visão macro global. Para quatro eixos - cidadão, estado, empresas, e enquadramento - encontramos diagnóstico e prescrição. Uma análise estratégica muito na senda de trabalhos da Mckinsey, parece-me! António Borges deu uma lição e, como seria de esperar, ficou-se pela teoria. As outras apresentações não acrescentam muito mas valem a visita, algumas pelo saber e outras pelo espanto.

O que faltou?
Se analisarmos com algum detalhe as propostas a debate e as apresentações efectuadas, percebemos que a Visão que os empresários e gestores têm para Portugal se resume ao quadro das preocupações das suas empresas; i.e. um Estado mais eficiente e eficaz. A temática andou sempre à volta das operações e muito pouco no campo da estratégia (Jorge Armindo andou lá perto, ficou-se nos conceitos). Contudo, a Nação não se esgota no Estado e muito menos na produção. Para se discutir um novo modelo económico para o País, digo eu que não sou economista, faltaram as perguntas de um milhão de dólares. Numa Europa em crescimento qual deve ser o nosso papel? E daqui a 10/20 anos? Onde nos diferenciamos? Em que sectores devemos apostar? Quais os objectivos e targets a atingir? Quais os factores críticos de sucesso para esse desiderato? Etc. (e.g. sabendo-se que a maioria do transporte internacional é feito por navios mercantes, e que o principal eixo que une a Europa aos mercados Americano e Asiático passa em mares nacionais, terá Portugal a oportunidade de se transformar num hub?).
Deixo como mostra de inconsistência uma proposta recorrente nas apresentações; melhorar a Educação! Contudo, para quê investir no ensino se não soubermos em que especializações devemos apostar?
É esta falta de agulha, a que muitos chamam estratégia, que faz falta. Aguardemos por mais Visão na 2ª convenção.

E agora?
Precisamos desta e de outras iniciativas. É fundamental questionar o futuro. Nenhum sector da sociedade civil se pode demitir deste propósito. E que não nos assomem vontades prossecutórias nem nos refugiemos em guetos intelectuais pois todas as iniciativas são válidas, cumpre-se assim a democracia.



Só conheço o astrolábio ...

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