sexta-feira, novembro 26, 2004

Adrenalina

Eram 5 horas. A praia estava deserta, nem a brisa a importunava. O impulso foi grande; ele nunca o soube explicar. Desceu os degraus que o levaram à areia e não resistiu a deixar a mão correr na rocha que acompanha a escadaria. Prazeres simples, estes, pensou, mas porventura os mais cheios.

Parou no último degrau e descalçou os mocassins. Avançou; um sorriso invadiu-lhe o rosto à medida que ia sentindo a areia aconchegar-lhe os pés. Há muito que precisava disto, seria Paz? Saiu dos pensamentos para fixar o mar, e que mar. Ao longe estava chão; ali, mesmo a quebrar na praia, a rebentação dava um ar da sua graça como uma criança a chamar a atenção.

Sentou-se. Enterrou os pés na areia até à bainha das calças; as mãos agarraram inconscientemente a areia que agora ele deixava escorrer devagar, sem que o olhar se perdesse nos ténues fios que criava, bastava-lhe sentir o formigueiro.

Olhou ao redor; nada, nem vivalma; perfeito, a praia seria só dele. Ao longe, bem no horizonte, o sol ameaçava despedir-se. O azul vivo fugia para Sul e o cinzento que anuncia a noite aproximava-se sem cerimónia de Norte.

Woolffff! Sobressaltou-se … o cão entrara na rebentação sem apelo nem agravo, de rompante, como faria qualquer herói que quisesse conquistar a praia. A adrenalina ainda iria aumentar. O pastor alemão, pachorrento, aproximava-se agora com a cabeça abaixo das espáduas … contudo a expressão não era de desafio, bem pelo contrário, o cão era manso. Estendeu a mão e fez-lhe festas; na nuca primeiro e depois na garganta; o cão, esse, nem se mexeu. Só a língua traía o prazer que dali tirou. Depois, sem aviso, sacudiu-se até se sentir seco …

- "Hahahaha! Desculpe, não resisti … coitado, ficou todo molhado! Tex, peça desculpa!"
Olhou-a, não era alta, os olhos azuis fixaram-no por momentos, o bastante para se sentir impressionado. Não seria incómodo, pelo contrário, seria antes atracção! Lembrou-se, alguém lhe falara que bastavam 7 segundos para haver um flash … seria?

Ela, pressentindo o perigo despediu-se com um “até já” meio a despropósito. Foi sentar-se a uns bons cem metros na direcção do pôr-do-sol. Ele perdeu-se na silhueta que se afastava enquanto o cão galgava a praia em percursos imaginados.

O cão voltava agora com um pau na boca; devolvera-o o mar e ele não lhe resistira. Largou-o junto ao homem e mirou-o a implorar por brincadeira. Ele levantou-se, agarrou no pau e atirou-o com toda a força que lhe veio, e o pau voou num movimento descoordenado até cair junto ao saco dela. Corou, não teria sido para ali que apontou …

O cão correu para lá. Agarrou no pau e regressou sem que o homem tivesse saído donde lançara. Largou novamente o pau. “Não, não era possível”” pensou, junto ao pau distinguiu nitidamente um anel. Pelo brilho seria ouro. Pegou nele e leu o nome que estava gravado no interior. Sorriu!

Foram cem metros intermináveis. O cão escoltava-o já com o pau na boca. Mesmo antes de a alcançar, ela virou-se e mostrou todo o esplendor … “magnífica!” … e, debruçando-se ao lado dela, abriu a mão e estendeu a palma onde repousava o anel ... “como sabias o meu nome?” indagou num sorriso tolo … a resposta foi pronta, sem receio, “porque estava à tua espera!”.


Este cão é um perigo … se o virem, fujam!

Reli a história e acho que vou mandá-la para a Maria ou para a TV Guia! Aceito sugestões …

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