sábado, setembro 30, 2006

Jura

(Prólogo - Ficção inspirada nos dois episódios que vi, mas que não retrata nenhuma situação vivida na telenovela que eu saiba. A estória da telenovela, essa, tem a sua fórmula. A partir de aqui será mais do mesmo, a receita repete-se e vem a monotonia, o desgaste do intelecto. Espero ter superado o original, mesmo sem cenas de sexo explícitas... a estória deixa no final uma dúvida, ou não, a interpretação será vossa. O cerne da ficção está na assunção da certeza, esta não é propriedade de ninguém, vivemos relações baseadas na confiança. A nobreza está em cumpri-la, o resto são "peanuts"! Por fim, procurei que a pontuação valorizasse o ritmo, que evidenciasse a ansiedade.)


Cheguei à praia com os primeiros raios de sol. A candura da areia batida pelo mar chão ainda era tolerável. Estendi a toalha e olhei demoradamente ao redor. Ninguém, teria por pouco tempo este paraíso só para mim. Deite-me na direcção do mar e deixei-me levar em pensamentos que me assolam quando a tranquilidade é soberana. A suavidade da areia conquistou-me pouco depois e, sem dar por isso, adormeci.
Um olá determinado fez-me regressar à luminosidade. Alguém se dirige para mim. Reconheço-lhe as feições, mas que raio, de onde o conheço? Cumprimentámo-nos e ele, sem ter perguntado, senta-se a meu lado. “Preciso de desabafar, pá!” ao que anuí com um movimento lânguido da cabeça acrescentando, “...aproveita, no estado em que estou posso ouvir tudo, duvido que me surpreendas...”, deitei novamente a cabeça e deixei-o à vontade.
Sabes, namoro há mais de um ano o que em mim é um feito... um feito! Sinto-me pela primeira vez arrebatado”. Entreabri um olho para lhe fixar a expressão e, ao contrário das palavras, não vislumbrei nenhum rasgo de felicidade, bem pelo contrário, o ar era grave. Preparei-me para sofrer, pois mesmo o desfrutar do paraíso tem o seu preço.
No início foi um mar de rosas, tudo era perfeito... mas pouco depois soube que ela se interessava por outro... amor mal resolvido, acho... apanhei-a em pequenas mentiras até ter encontrado um post-it esquecido com um telefone e um pequeno coração... uma merda... telefonei, claro, para confirmar a voz masculina... cabrão!”, mantive-me mudo, o cenário só podia piorar, “... mais tarde, não sou parvo, vi-lhe os SMS e lá estavam os do chibo, vários, todos insinuantes, alguns a combinar encontros, outros a recordá-los com paixão... foda-se!”, pensei entrar em coma mas não encontrei nenhum expediente rápido, “... investiguei e descobri que o gajo é de Lisboa, vive na Expo...”, para desanuviar disparei, “também eu, boa zona!”, ele não se ficou, “eu sei, eu sei...”, um arrepio gélido percorreu-me as costas, “... e acreditas que o sacana se encontrava com ela descaradamente em casa a meio do dia, vi-os...”, aqui tive de o interromper, “e abordaste-os?”, “quem, eu, nunca, a vingança serve-se fria, não achas?”, abri novamente os olhos, o olhar dele era penetrante, quase inquisitório, mas não demonstrei qualquer temor.
Os meus pensamentos voavam, quem seria este tipo, eu sou livre e não nego aventuras mas quem seria a gaja, muitas dúvidas sem resposta, tudo isto interrompido pela confissão, “... os gajos começaram a ganhar confiança e ela chegava cada vez mais tarde a casa, às vezes depois da meia-noite, as desculpas eram as mesmas, trabalho e mais trabalho, depois foram os fins-de-semana, um dia resolvi segui-los...”, não aguentei, “... mas aturaste essa merda?”, “aguenta, vais perceber, o gajo tinha um alfa vermelho, o típico carro dos pintas...”, interrompi-o novamente, “mas, espera lá, eu tenho um também...”, “eu sei, eu sei, mas não é isso, é que o gajo levou-a para o Algarve, foram para um SPA, sacanas, e eu fiquei à espera para rebentar com aquela merda toda!”, timidamente perguntei-lhe, “... mas estamos no Algarve, eles estão cá?”, o silêncio parecia agora uma faca aguda que cortava o ar, “... claro, estão nesta praia!”, sentei-me num movimento único como se uma mola me tivesse impulsionado, “porra, o que queres insinuar?”, ele sorriu, “... de quem é essa toalha ao teu lado?”, por momentos senti-me no twilight zone, “... qual toalha, só aqui está a minha!”, ele tornou a sorrir, “... vês, não tens nada a temer!”, senti-me a explodir, “mas de onde nos conhecemos?!”, a gargalhada foi violenta, cheia, como se estivesse à espera deste momento para desfrutar e, levantando-se, concluiu, “... não nos conhecemos, por isso desabafei. Fica bem!”.
Vio-o afastar-se até a silhueta desaparecer no areal, respirei fundo, tentava perceber o que se passara, a Lígia, essa, dormia ainda no hotel, com quem sonharia?


Ela a gozar o prato, ele com cara de enfiado... não, ainda não...

Se os meus amigos fossem semelhantes aos da telenovela Jura, juro que mudava de vida!


Nota 1: a pesquisa da foto da Jura foi educativa. Por incrível que pareça já há blogues com vídeos da telenovela... a pagantes. Deve andar por aí muita gente carente...

Nota 2: não vejo telenovelas, dão-me tédio; na televisão prefiro ver filmes (de livros que ainda não li, o inverso é geralmente doloroso), séries (Sopranos e CSI), telejornais (os da SIC notícias a más horas), debates (o prós e contras), documentários (biográficos, natureza, etc.), comédia (o Jay Leno que adoro), futebol (competições europeias) e algum cinema animado (raro, sou apaixonado por BD). Dispenso igualmente os analistas (Marcelo, Portas, Vitorino, Rogeiro e Sousa Tavares) por não gostar de quem de tudo fala, mas que nem de tudo sabe. Não critico os que gostam de Soaps, não são piores do que eu, mas sou assim. Contudo, não deixei de ver alguns episódios das novelas da moda, Jura e L Show. A primeira por ser um modelo arriscado que, na busca de audiências, retrata uma franja da sociedade a viver a vida pelo desejo. A segunda por apresentar uma visão das mulheres que geralmente está arredada do nosso quotidiano e ser, assim, uma realidade insondável. Gostava de saber o que pensam destas telenovelas, se é que as viram.

Nota 3: e porque o fim-de-semana promete, gatos e cães segundo os anglo-saxões, deixo-vos os Supertramp.

12 comentários:

Madeira Inside disse...

Olá!!
Gostei deo que vi por aqui!!
Original sem senhor! Voltarei!!
Obrigada pela visita!!

Bjs

p.s.ainda não vi a novela

Andreia disse...

Ainda não vi a Jura nenhuma vez... Mas já ouvi falar dela...

Parece que o pessoal a acha interessante.

Haddock disse...

Não vi. Também não vou ver. Já não posso com novelas, seja lá de que tipo for.

Gotinha disse...

Jura??! Bah... nunca vi a não ser o vídeo teaser.
Agora se me falas deSupertramp... bem conquistas-me!!!
:-)

João Mãos de Tesoura disse...

natalie: não viste a novela? Deitas-te cedo? Pudera, com uma cama de rede! Não te apoquentes, eu só vi 2 episódios por engano... por momentos pensei que a TV Cabo me tinha oferecido o canal 18! hahahaha
Beijos, volta sempre!

andreia: jura que não viste! :D Podes ser sincera, os teus pais não lêem o Exacto! ;)
Acho que o mercado alvo deve apanhar a faixa dos 25 aos 35, mas os mais novos devem gostar da devassa e os mais velhos de recordá-la.
Beijos

haddock: assino por baixo e por cima! Faltaram as altercações para seres um haddock legítimo! :) Li a colecção toda do Hergé, um must!

gotinha: uma mulher como tu e ainda não viste o Jura? Aposto que estás a cruzar os dedos! Olha que a São castiga-te! :D Os Supertramp serão sempre uma banda de culto, tinham um som inconfundível. Quanto a conquistar-te, eu que conheci o Goto... vamos ser só amigos, tá! :D Cumprimentos à família!
Beijos

Zeca disse...

Por acaso até vejo novela.
Saberás tu iminência qual?
Eu digo
Então diz lá.
A minha e já é um pau.
Olha se fosse uma vara?
Obrigado pela visita
Não há quem consiga tirar as amarras a isto, porra.
Bom Fim de Semana
Fica bem

João Mãos de Tesoura disse...

zeca: grande novela, com espaço publicitário e tudo! :D
Volta sempre,
Abraço


P.S.: será que ninguém leu o meu texto? É assim tão mau... :D

Eli disse...

Eu li tudo. Não tenho andado a ler blogs, mas achei-o interessante. Já não vejo televisão, à excepção de aguns filmes e séries...

O texto é muito interessante. O que é certo é que existem pessoas capazes de fazer esse porco "jogo duplo". Não sei se esta história é retratada na novela... mas tem o seu interesse, principalmente do ponto de vista dos dois homens e dos seus sonhos...

Obrigada pela visita!

:)

João Mãos de Tesoura disse...

eli: o texto é de facto ficcional. Procurei, como noutras prosas, utilizar a pontuação para dar um ritmo próprio, quase sem fôlego para introduzir a ansiedade do momento. Não sei se o consegui.
Penso que no teu último comentário te referiste aos homens numa lógica sem género; de facto, mais do que sonhos, acho que homens e mulheres condicionam a sua vida, as suas relações, em função dos níveis de confiança que estabelecem. Vivemos numa sociedade complexa, onde as oportunidades e apetência pela traição são inúmeras. A razão não impera, andamos demasiado emocionais. O amor, esse, deixou de ser um acto de vontade para se reduzir a um compromisso social. Tudo é de consumo imediato, tudo é exequível, não há convicções fortes. A angústia, essa, virá no fim!

Cerejinha disse...

Não li!
Não vejo!
:-D

Principessa disse...

vi 3 vezes, e penso se não terei uma vida um bocado sem sal ao pé deles... seja cm for, gosto da minha vida tal como ela é... ah e tb gostei do teu texto

João Mãos de Tesoura disse...

principessa: a vida deles atrai. O perigo, a emoção, a descoberta e o prazer. Mas depois fica o vazio, o prazer pelo prazer. Aguenta-se uns tempos, mas a falta de afectos faz-nos partir para outros rumos.
Beijos