Num só movimento ficou de pé e, sem perguntar, dirigiu-se ao mar determinado em banhar-se. Não olhou para trás, nunca o saberia mas os óculos escuros de Paula escondiam a tristeza da solidão partilhada, dos gestos esquecidos. Mergulhou de pronto como sempre fazia e procurou a areia que lançou numa emersão forçada. Repetiu o gesto várias vezes como se a adrenalina se esgotasse ali.
Uma dor percorreu-lhe o peito, primeiro leve e depois em crescendo. Sentiu-se desfalecer, olhou a praia a procurar ajuda, a tentar gritar nos gestos que ainda desenhava. O peso empurrava-o agora para baixo e nada impedia a tragédia, nem a força nem a vontade. Fria, cada vez mais fria, a água embrulhava-o num abraço fatal. O corpo balançava ao sabor da corrente, inerte, um corpo que ele já não sentia. Abriu os olhos, a luz ia agora ficando mais ténue como se fosse anunciar o descanso. Estava estranhamente tranquilo, não temia a morte, tão pouco louvava a vida. O silêncio veio para lhe calar os pensamentos, cada vez mais vagos, sempre distantes na infância.
A estalada foi pronta. Não era a primeira mas, no desespero, Paula não se continha. O banheiro, homem experimentado por anos de veraneio, aplicava tudo o que sabia com uma determinação cega, mesmo violenta. Paula ajudava, era ela que fazia a respiração boca-a-boca num controlo aterrorizado, na esperança do impossível, do milagre.
No início veio a dor distante mas cada vez mais sentida. A escuridão era total num aperto que o deixou em pânico. A dor crescia na solidão que o amordaçava. Sentiu a vida que nunca teve, chorou um choro nunca ouvido e, por um breve momento, sentiu a presença Dele, do conforto que desesperadamente procurava. Não era uma voz, não, era algo maior que o despertava, que o fazia sentir feliz, cheio, o abraço que nunca teve. Sentiu agora a seda, leve, com uma suavidade delicada. O turbilhão imenso projectou-o para cima num impulso impossível. A seda era agora mais macia, quase húmida. Mexeu os lábios a acompanhar o beijo imaginário com um carinho que só o amor conhece.
A luz despontava num incómodo desconcertante. Conseguia agora distinguir a face que o beijava. Nunca se sentira tão pleno, emerso em paz.
Arriscou perguntar - onde estou?
Renasceste amor - afiançou-lhe Paula, deixando cair uma lágrima que acariciou a face gémea.
Só as cinzas não renascem...
9 comentários:
Gostei da tua metáfora. Não há nada como renascer para a vida, ainda que a mesma, mas a ser vivida com um ânimo redescoberto. Como é difícil às vezes ver o que está perto, sobretudo porque nos concentramos em focar o que a nossa vista não alcança. Felicidade pode ser tão simples como olhar para o horizonte e descobrir nele as cores da nossa alma.
Isabel
Como dizia Lex Luthor: "a vida é uma jornada e não devemos atravessá-la usando mapas".
Abraços João!
Oi João !!!!
Fantástico post. Gostei a sério do teu blog e conto voltar. Gosto da forma como escreves, plena de emoção.
Muito obrigada pela visita lá na casquinha e pelas palavras simpáticas que deixaste.
Volta sempre que quiseres.
:))
Descobri que voltaste no Blog do Thiago...
Ainda bem, estou feliz com o teu regresso!
Não li o teu texto, não posso forçar a vista por enquanto, mas já dá para me "entreter" por aqui...
Deixo-te um abraço saudoso ;)
Cá estamos! :-)
(Re)Boas vindas.
Um abraço
Um regresso em grande :-)
Sê muito "bem-voltado"!
Welcome back!
amanhã volto para ler-te com calma...entretanto deixei-te uma prenda no novo!
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Isabel: a redescoberta é sempre uma surpresa! De facto, somos todos cegos ou, mais singelamente, complicamos o fácil!
Tiago: e o super homem ficou-se? :)
caracolinha: emoção não vai faltar, basta ir às compras! :D
myanmar: já estive no mar de myamnmar, depois desci para o mar da Tailândia até ao da Malásia! Depois, 2 anos depois, veio o Tsunami!
menina marota: ainda bem que não o leste, acredita que ficavas de olhos em bico! :D
miguel: e continuamos! Abraço
andreia: volta sempre!
robina: grande? Só se for no Entroncamento! :D
mushu: well come back! Cada um come o que quer... :D
irmão público: e ela apareceu-te de óculos escuros... o que te valeu foi a bengala! :D
luna: ler-me com calma? Isso, nem a minha alma! :)
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